Cúpula dos Povos: Tribunal em defesa dos corpos e territórios das mulheres e dissidências sexuais e de gênero

16/12/2025 por

O Tribunal em defesa dos corpos e territórios das mulheres e dissidências sexuais e de gênero ocorreu na quinta-feira, 13 de novembro de 2025, como parte do Eixo 6 da Cúpula dos Povos frente à COP30, cujo tema foi “Feminismo popular e resistência das mulheres nos territórios”. A atividade foi organizada pela Iniciativa Internacional de Mulheres sobre Corpos e Territórios, pela Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB), pelo Grupo Impulsor Mulheres e Mudança Climática (Peru) e pela Coalizão Mundial pelos Bosques (GFC).

Foram apresentados nove casos de diferentes países do Sul Global, mostrando como múltiplas formas de violência afetam os corpos e territórios das mulheres e pessoas dissidentes. Os depoimentos apontaram o modelo capitalista extrativista, racista e patriarcal como causa central da crise ecológica e das violações de direitos nos territórios. Apresentaram seus casos Assalah Abu Khdeir da Marcha Mundial de Mulheres na Palestina, Juslene Tyresias da Via Campesina no Haiti, Chaba Siny da MMM no Saara Ocidental, Olivia Bisa Tirko do Governo Territorial Autônomo da Nação Chapra no Perú, Beku Gogti, do povo indígena Xikrin representando o Movimento pela Soberania Popular na Mineração do Brasil, Cledeneuza Bizerra do Movimento Quebradeiras de Côco Babaçu, Alejandra Laprea da MMM Venezuela, Julia Chunil liderança indígena mapuche do Chile, Maria José Lubertino da Rede Ecofeminista da América Latina e do Caribe e Melisandra mulher trans da Casa Cura de Belém do Pará.

Representando diversos territórios da MMM ao redor do mundo, nossas militantes internacionalistas apresentaram os desafios enfrentados pelas mulheres nos seus territórios. Assalah Abu Khdeir, da MMM na Palestina, denunciou a situação vivida por seu povo e os impactos diretos sobre mulheres e crianças:

Chaba Siny, do Saara Ocidental, falou sobre a repressão contra mulheres saharauis e a negação do direito à autodeterminação:

Alejandra Laprea, da Venezuela, relatou os efeitos do bloqueio econômico sobre a vida das mulheres, especialmente no trabalho de cuidados e nos deslocamentos forçados. Assista o trecho:

O Tribunal foi composto por juízas de diferentes regiões do mundo, com atuação em movimentos de mulheres, justiça climática e defesa de territórios. Segundo as organizadoras, os relatos evidenciaram a relação entre crise climática, neocolonialismo, conflitos armados e aprofundamento das desigualdades, além da ausência de respostas efetivas dos Estados. Formaram a banca julgadora Sophie Dowlar, da MMM no Quênia, Uli Arta Siagian, ativista por justiça climática na Indonésia, Nazely Vardanyan dos Bosques Armênios representando a Asia e Leste Europeu, Marisol García, liderança indígena kichwa do Perú e Celia Xacriabá, liderança indígena e deputada federal no Brasil.

Ao final, os testemunhos destacaram que a crise climática intensifica as violências já existentes e que as resistências das mulheres se constroem de forma coletiva, a partir de seus territórios, saberes e formas de organização.

Saiba mais sobre essa atividade aqui.

Fotos: Noelly Castro – MMM Campinas/ SP

SENTENÇA DO TRIBUNAL

Este tribunal é composto por mulheres guerreiras que lutam e resistem. Elas aprenderam com a floresta, com a ciência e com a terra. Precisamos falar de uma justiça que não seja patriarcal, colonial nem monocultural e, diferentemente do que vemos no Norte Global, estamos aqui para fazer uma justiça verdadeira, com juízas da África, da Ásia Central, do Sudeste Asiático e da América Latina e do Caribe.

Ouvimos mulheres e dissidências de gênero que vieram prestar testemunho. Elas representam a diversidade de ser mulher, e nós emitiremos um veredicto que responsabilizará os países do Sul que não respeitam nossa natureza nem nossos corpos. Viemos de um processo de neocolonização do Norte Global, com suas grandes empresas e projetos que arrancam as florestas, com um capitalismo predatório que mata filhes, as infâncias, que mata nossos territórios e vê as florestas como mercadoria, explorando nossos ecossistemas.

Os criminosos são coletivos e as vítimas também são coletivas, e, neste veredicto, denunciaremos quem viola direitos de forma qualificada. Assim, este tribunal declara que:

  • Denunciará os responsáveis perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos, qualificando os crimes contra mulheres e dissidências de gênero como crimes contra a humanidade e violações dos direitos humanos e da natureza, uma vez que nossos corpos e territórios devem ser protegidos pelo direito internacional. Quem mata as mulheres mata a natureza e mata a humanidade.
  • Exige justiça financeira para as lutas das mulheres e dissidências, considerando que somos nós que sofremos a violação de direitos em nossos territórios, na linha de frente.
  • Exige reparações econômicas por ocupações ilegais, extermínio, violações, destruição e danos socioambientais, culturais e espirituais, considerando as perspectivas culturais das forças de segurança.
  • Exige o reconhecimento de um Estado plurinacional que reconheça a multiplicidade de nossas organizações sociais e a importância de situar mulheres e dissidências sexuais e de gênero no centro do poder e da tomada de decisões. Se somos a solução, precisamos de mulheres representantes nas Nações Unidas, nos parlamentos, nos ministérios de Estado e nas mesas de negociação.
  • Este Tribunal fará uma escuta qualificada de casos da República Democrática do Congo e do Sudão e, mais recentemente, do Rio de Janeiro, onde foram apresentadas situações de ecocídio, genocídio, feminicídio, transfeminicídio e etnofeminicídio. Escutaremos com atenção, levando em conta o recorte racial, o Acordo de Escazú e a perspectiva de gênero.

Este Tribunal declara culpado quem se omite em enfrentar a violência e reconhece as múltiplas violências que são cometidas contra as mulheres em todo o mundo. São 158 milhões de mulheres em situação de pobreza, e é necessário contar com leis que tipifiquem como crime os deslocamentos forçados pela violência, pelos impactos dos agrotóxicos em nossa saúde, pelo ódio e pela omissão dos Estados.

Por isso, em um ato histórico, nos convocamos nesta COP 30, no Acordo de Paris e na Carta de Belém, porque são as mulheres que defendem com veemência e coragem as vidas. Não é possível um planeta sem as mulheres.

Belém do Pará, 13 de novembro de 2025

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