Na última semana, em mais uma atividade preparatória para a IV Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres em São Paulo, mulheres representantes dos diferentes municípios e comunidades produtivas quilombolas e indígenas do Vale do Ribeira, região que vai receber a mobilização, estiveram juntas para construir coletivamente a programação da ação.
Reunidas na cidade de Registro (SP), cerca de 20 lideranças locais aproveitaram dois dias de agenda para elencar as principais pautas da luta das mulheres da região. Estes temas serão aprofundados e debatidos as mais de 500 mulheres que são esperadas para esta edição da Ação Internacional, nos dias 10 e 11 de julho.
O encontro foi aberto por uma apresentação do histórico global e nacional da Marcha Mundial das Mulheres, seguido de exibição de um mini documentário sobre a última ação do movimento, em 2005, que uniu cerca de 3 mil mulheres de todo o país em marcha de Campinas a São Paulo. Na sequência, uma roda de conversa iniciou a discussão sobre a importância da realização da ação no Vale do Ribeira.
Vera Lucia Oliveira, secretária de Políticas Sociais do Sintravale e Secretária de Políticas para a Mulher da Federação da Agricultura Familiar do Vale do Ribeira, ficou satisfeita em saber que a região receberá a edição paulistana da IV Ação Internacional da Marcha das Mulheres. “As mulheres da região tem pouco contato com movimentos que lutam pelas causas das mulheres. Por sua vez, têm muito contato com a opressão em praticamente todos os espaços que convivem, em casa, na roça, na rua”, comenta.
As militantes do MAB – Movimento dos Atingidos por Barragens – Carla Fernanda Galvão e Debora Almeida, compartilham a expectativa sobre a realização da IV Ação em Registro. Confira as entrevistas abaixo.
Na parte da tarde, as mulheres participaram de atividade lúdica: divididas em três grupos, elas ‘desenharam’ uma imagem que representasse o que elas esperam que a IV Ação Internacional da Marcha das Mulheres deixe de legado para o Vale do Ribeira, a partir de demandas específicas da região. De maneira geral, os grupos exaltaram a importância de apresentar à região a força da existência de suas atividades e diversas comunidades, e o quanto tudo isso representa “resistência” a um modo de produção e comercialização não sustentáveis; a importância do fortalecimento e união das mulheres para mudarem e melhorarem as suas realidades e cotidiano; e também a importância da Marcha Mundial das Mulheres como “referência” de mulheres que, juntas, lutam pelas causas de outras mulheres.
Durante a conversa que apresentou o trabalho de cada grupo, as pautas de lutas das mulheres locais foram levantadas. São elas:
. Economia solidária como resistência
. Pescadoras e o seguro defeso
. Violência doméstica
. Resistência às barragens no Rio Ribeira
. Os perigos do fundamentalismo religioso – a opressão ao povo e às mulheres
. A comercialização, pelas mulheres, dos alimentos que produzem
. Titulação dos quilombos
. Resistência mineradora
Todas as pautas levantadas pelo grupo que se reuniu em Registro será, de alguma forma, considerado na programação da IV Ação Internacional da Marcha Mundial das Mulheres que, em seu primeiro dia (10 de julho), tem bastante foco na formação política feminista das mulheres que participam da ação.
Após um dia inteiro de discussões temáticas, o encontro em Registro foi finalizado com uma oficina de batucada para que as lideranças já entrem no clima das ações da Marcha Mundial das Mulheres.
A 4ª Ação Internacional da Marcha das Mulheres
Com o lema “Seguiremos em marcha até que todas sejamos livres”, a 4ª edição da Ação Internacional da Marcha das Mulheres acontece cinco anos após a última mobilização, quando mais de duas mil mulheres de todo o país marcharam por cerca de 100 km para dar visibilidade à luta das mulheres.
Diferente dos outros anos, a edição de 2015 é descentralizada, enraizada localmente com objetivo de visibilizar as lutas das mulheres em seus territórios específicos, suas resistências e alternativas. Duas ações descentralizadas já aconteceram este ano: em Tocantins onde as mulheres afirmaram a auto-organização e o feminismo como movimento social, e em Minas Gerais, onde cerca de 3 mil mulheres marcharam em defesa da água e de seus territórios, e contra a mineração. As próximas ações são em São Paulo, Paraíba, Mato Grosso do Sul, Rio Grande do Sul, Ceará e Rio Grande do Norte.
Sobre a escolha do Vale do Ribeira para a ação em São Paulo
As mulheres do Vale do Ribeira têm buscado alternativas de trabalho e renda e construído resistência neste complexo território que, ao mesmo tempo que preserva a natureza, exclui as pessoas que historicamente nasceram e vivem ali – principalmente as mulheres. Como parte da resistência, elas organizaram, em 2013, um comitê da Marcha Mundial das Mulheres, que agrega participantes de varias cidades da região e reivindicaram que a Ação Internacional de 2015 fosse realizada na região, em defesa de melhores condições de vida e trabalho, além da comercialização justa do que produzem. Outra pauta importante das mulheres do Vale do Ribeira é chamar a atenção da sociedade para as licenças ambientais concedidas às construções de barragens e as atividades de mineração, privilegiando a histórica concentração de terras e grandes empreendimentos na região, ameaçando as comunidades tradicionais.
Atendendo à solicitação das companheiras do Vale do Ribeira, a executiva estadual da Marcha Mundial das Mulheres realizará sua 4ª Ação Internacional em Registro, reunindo mulheres de diferentes partes do estado – e também do Paraná – para afirmar a economia solidária, a agroecologia, as experiências e o conhecimento e práticas das mulheres como caminho para transformar um modelo de reprodução, produção e consumo que explora o trabalho da mulher, controla seu corpo e esgota a natureza.
Conheça o Vale do Ribeira
O Vale do Ribeira é formado por 25 municípios e cerca de 25% da população da região vive na área rural. São mais de 7 mil agricultoras e agricultores familiares, 159 famílias assentadas, 33 comunidades quilombolas e 13 terras indígenas. Abriga ainda 12 unidades de conservação, com 7 parques estaduais, 3 áreas de preservação ambiental e 2 estações ecológicas. Ao mesmo tempo, a infraestrutura de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgotos, as condições de habitação e níveis de renda e de escolaridade, contrastam com o restante do Estado de São Paulo, o que faz do Vale do Ribeira uma de suas regiões mais empobrecidas.