A Cúpula dos Povos aconteceu entre os dias 02 e 07 de dezembro, na Universidade de Santiago do Chile (USACH), com participação de movimentos de várias partes do mundo. A Cúpula é um momento de afirmação das respostas dos movimentos sociais para a crise climática, em contraposição às falsas soluções do mercado, apresentadas no mesmo período na Conferência da ONU (COP 25). A COP estava planejada para acontecer também no Chile, mas, devido às intensas manifestações, foi transferida para Madrid, Espanha. A Cúpula dos Povos se manteve no Chile, se colocando assim o papel conjuntural de apoio às manifestações e denúncia da repressão e do modelo neoliberal.
A programação foi estruturada por painéis centrais, com temas como o a crise climática, o neoliberalismo, a Constituinte chilena, e por rodas de conversa paralelas, puxadas pelas organizações. Foi um espaço importante para reafirmar laços entre os movimentos no compromisso com a justiça climática e na luta por uma transformação social sistêmica.
Este ponto se expressou, por exemplo, na mesa “A crise como negócio, mecanismos de mercado e privatização da natureza”, convocada pela organização Amigos da Terra junto à Marcha Mundial das Mulheres, ao Instituto Transnacional e à Confederação Sindical das Américas (CSA), organizações que compõem a Jornada Continental pela democracia e contra o Neoliberalismo. A mesa colocou a agenda comum de ambientalistas, sindicalistas e feministas, e debates para compreender o contexto atual. Letícia Paranhos, da Amigos da Terra, disse ser necessário “ir além do conflito capital-trabalho, porque hoje assistimos a um conflito capital-vida”. “Para este sistema, existem vidas que são descartáveis, vidas que não importam para o capital”, alertou. Natália Lobo, da MMM Brasil, disse que “é preciso colocar a lógica da vida em nossas ações políticas. As falsas soluções não oferecem saídas à crise porque não colocam a vida em primeiro lugar. Para isso, é necessária uma mudança de sistema”.
O feminismo teve bastante protagonismo no encontro. Todos os dias, a Tenda das Mulheres, organizada pela Marcha Mundial das Mulheres do Chile, teve uma programação intensa, com muita participação e integração com o encontro por inteiro, e intervenções culturais muito animadas e politizadas – dentre elas, o grupo Comparsa Jardinera fazia versões feministas para canções tradicionais chilenas, e danças em homenagem a lutadoras como Macarena Valdés, liderança ambientalista chilena que liderou a luta contra a instalação de uma hidrelétrica e foi assassinada em 2016, em um crime ainda não solucionado pelas autoridades. Durante as atividades, se falou muito sobre a violência exercida contra as mulheres que estão na linha de frente das resistências contra os extrativismos, tanto no meio rural como urbano. A declaração final da Tenda de Mulheres e a da Cúpula dos Povos já estão disponíveis online. O folheto produzido pela Marcha Mundial das Mulheres e distribuído por lá também está online.
Miriam Nobre, da MMM Brasil, participou em duas rodas de conversa. Fez a apresentação de contexto sobre economia feminista na Oficina sobre Economia feminista e soberania alimentar, e esteve na roda de conversa “Olhares sobre o patriarcado em Nuestramérica”, junto a Cony Oviedo, da CONAMURI (Paraguai), Viviana Catrileo, da ANAMURI (Chile), Marissa Reyes Diaz, da It Takes Roots e Organização Boricuá de Agricultura Ecológica (Porto Rico). Neste espaço, Miriam falou sobre as formas atuais de apropriação do trabalho das mulheres, as armadilhas do capitalismo patriarcal e racista, que endivida as pessoas, impõe super-exploração e trabalho informal e obriga as mulheres a garantir o cuidado e a reprodução da vida.
No dia 06, as e os participantes saíram em marcha desde a CUT até a Praça da Dignidade, onde tem acontecido muitas manifestações, e se somaram a uma manifestação contra o presidente do Chile Sebastián Piñera e suas políticas neoliberais.
No dia 07, além do encerramento da Cúpula dos Povos, aconteceu a Escola de Formação da MMM, com a presença de companheiras do Brasil, Argentina, várias regiões do Chile, Paraguai, Peru, Estados Unidos e Quebéc. Nessa formação, as mulheres compartilharam experiências do último período no território e observaram o que há de comum nas agendas locais, acumulando para a 5ª Ação Internacional da MMM, que acontecerá ao longo de 2020.
Desde a Cúpula dos Povos, uma delegação se somou às delegações de movimentos que já estavam em Madrid. Em resposta aos posicionamentos do Brasil na COP25, dezenas de organizações brasileiras assinaram um documento em denúncia aos offsets florestais, que significam, na prática, a entrega das florestas para o mercado de carbono.