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Deixem Apyka’i viver! Demarcação das terras indígenas já!

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Uma das comunidades Guarani Kaiowá mais vulneráveis do Estado do Mato Grosso do Sul recebeu uma ordem judicial do senhor juiz Fábio Kaiut Nunes, da 1ª Vara Federal de Dourados, e deverá ser despejada de seu tekoha em 24h. O Com isso, o juiz autorizou o massacre e genocídio (extermínio) dos/as sobreviventes de Apyka’i. Doma Damiana, liderança histórica de Tekoha, que já perdeu todos de sua família na luta pela resistência em sua terra originária, afirma que ninguém sairá do local.

A decisão judicial foi a favor do proprietário da fazenda Serrana – incidente sobre o território reivindicado – Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, que arrenda a área para a Usina São Fernando, de José Carlos Bumlai, preso em 2015 na Operação Lava Jato.

Há décadas vivendo na beira da estrada, ataques de seguranças privados, barracos criminosamente incendiados a mando de produtores rurais, bebendo a água podre dos córregos envenenados pela monocultura, o Apyka’i pode ser considerado como uma comunidade modelo do genocídio que sofrem os povos indígenas no Mato Grosso do Sul.

Diversas pessoas já faleceram no local, seja por atropelamento, ou envenenadas por agrotóxicos em plantações que circundam na retomada. Mesmo assim, a população indígena Guarani Kaiowá resiste bravamente, mesmo com ataques constantes do agronegócio, com auxílio do poder judiciário.

Sendo assim, nós da Marcha Mundial das Mulheres no Brasil e do mundo denunciamos mais uma vez o genocídio contra os povos originários, reivindicamos a demarcação das terras indígenas imediatamente no estado do Mato Grosso do Sul e no Brasil e solicitamos com dor e revolta ao Supremo Tribunal Federal que anule o pedido de reintegração de posse da comunidade indígena Apyka’i.

Pelo fim do genocídio! Pela demarcação das terras indígenas!

O QUE É A APYKA’I?

Apyka’i, “comunidade modelo” do genocídio que fica nos arredores da cidade de Dourados/MS.

Mais de uma década vivendo na beira da estrada, sofrendo ataques de seguranças privados, barracos incendiados a mando de produtores rurais, bebendo da água mais podre dos córregos envenenados pela monocultura – o Apyka’i figura como uma espécie de “comunidade modelo” do genocídio que sofrem os povos indígenas no Brasil.

Várias pessoas já faleceram no local, vítimas de atropelamentos, envenenada por agrotóxicos utilizados nas plantações que circundam a retomada. As pessoas sobrevivem essencialmente de doações e de cestas básicas oferecidas por apoiadores e pela Funai. Não tem acesso à água, à floresta, è educação, saúde, à segurança ou a dignidade mínima.

A SITUAÇÃO

Após o governo do estado ter se recusado a usar a Polícia Militar para realizar o despejo das nove famílias Kaiowa e Guarani do tekoha Apyka’i, em Dourados (MS), o juiz federal Fábio Kaiut Nunes requisitou ao Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, o envio de tropas da Força Nacional de Segurança Pública para retirar os indígenas da área. Mesmo sem polícia para efetuar a ação, a Justiça notificou a liderança da comunidade, Damiana Cavanha. A indígena afirmou que a comunidade não deixará a área, arrendada pela a Usina São Fernando, propriedade de José Carlos Bumlai. A Fundação Nacional do Índio (Funai) entrou com pedido de Suspensão de Liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), para evitar o confronto.

Na última quarta, 8, Damiana foi levada até a sede da Funai para receber a notificação da oficial de Justiça. A liderança, no entanto, recusou-se a assinar o documento. “Não vou assinar nada. Pode cavar o buraco para enterrar todos, porque não vamos sair do nosso tekoha”, afirmou, respondendo ao pedido da oficial. Mesmo sem a assinatura, o prazo de cinco dias estabelecido na decisão judicial para cumprimento da ordem passa a valer. O despejo deverá acontecer entre os dias 13 e 15 de junho, a pedido do proprietário da fazenda Serrana (arrendada para a usina), Cassio Guilherme Bonilha Tecchio.

SEM POLÍCIA

Esta não é a primeira vez que o juiz substituto da 1a. Vara da Justiça Federal de Dourados  decide pela reintegração de posse contra os Kaiowa de Apyka’i, apesar da forte oposição de organizações de direitos humanos do mundo todo contra o despejo.

Na última decisão, em maio, Kaiut requisitou ao governo do Mato Grosso do Sul o uso da PM para o cumprir a reintegração, mas o pedido foi negado. Em sua decisão, Kaiut exige que a Procuradoria Geral da República “adote as medidas cabíveis” contra o governo do estado pelo não-cumprimento, e solicitou ao Ministro da Justiça o uso da Força Nacional, que ainda não respondeu ao pedido.

Dias depois de assumir o Ministério da Justiça no governo provisório de Michel Temer (PMDB), o ex-secretário de Segurança do estado de São Paulo Alexandre de Moraes afirmou à imprensa que irá combater “movimentos de esquerda”, e que ações de grupos que ocupem terras – em referência ao Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), citado pelo ministro – “vão ser combatidas assim como os crimes”.

Antes dos cargos públicos, Alexandre atuava como advogado e trabalhou também para o deputado federal afastado Eduardo Cunha (PMDB/RJ). Em 2014, Cunha foi defendido por Alexandre numa ação em que era acusado de usar documento falso. Alexandre conseguiu a absolvição de Cunha no STF.

A USINA

Instalada em Dourados em 2009, a Usina São Fernando é um empreendimento do Grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos produtores e exportadores de itens de origem animal das Américas, e da Agropecuária JB, ligada ao Grupo Bumlai (propriedade do pecuarista José Carlos Bumlai), especializado em melhoramento genético de gado de corte. Um dos territórios utilizados pela usina para produzir cana é reivindicado pelos Kaiowá de Apyka’i.

Em 2010, sob perigo de perder sua licença de operação em função de diversos descumprimentos legais em questões trabalhalistas, ambientais e indígenas, a usina teve de assinar um termo de cooperação e compromisso de responsabilidades na Justiça.

Entre as condicionantes estabelecidas pelo Ministério Público Estadual, Ministério Público do Trabalho e MPF, a usina era obrigada a não renovar o contrato de arrendamento da fazenda Serrana, de Cássio Guilherme Bonilha Tecchio, propriedade que incide sobre o território reivindicado como Apyka’i pela família de Damiana, quando o atual findasse.

Em 2015, José Carlos Bumlai foi preso no decurso da Operação Lava Jato, acusado de fazer parte de um esquema de corrupção e fraude no pagamento de dívidas de campanha eleitoral do Partido dos Trabalhadores.

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