Capa / Notas e posicionamentos / Documento de análises e reivindicações da Marcha Mundial das Mulheres no G20 Social

Documento de análises e reivindicações da Marcha Mundial das Mulheres no G20 Social

Durante o G20 Social, realizado em novembro de 2024 no Rio de Janeiro (RJ), a Marcha Mundial das Mulheres (MMM) participou de uma série de discussões, além de promover duas atividades autogestionadas, uma sobre militarização e outra sobre economia feminista. Este documento é uma síntese das nossas elaborações coletivas sobre esses dois temas, fundamentais em nossa agenda política feminista, antirracista, antipatriarcal e internacionalista. A síntese foi organizada pelas militantes Carol Peterli e Dara Sant’Anna, da MMM RJ, e Sonia Coelho, da MMM SC e da Executiva Nacional da Marcha.

As mulheres exigem o fim do genocídio do povo palestino e das guerras do imperialismo no mundo! Economia feminista para colocar a sustentabilidade da vida à frente do capital!

Durante os dias 14 e 15 de novembro, nós da Marcha Mundial de Mulheres participamos do G20 Social, espaço promovido pelo governo brasileiro para dialogar com organizações e movimentos sociais do Brasil e do mundo, com o intuito de ampliar o debate sobre as soluções para a crise econômica e socioambiental que atravessamos atualmente. Entendemos que o G20, que reúne as 20 maiores economias do mundo, tem apresentado falsas soluções para a crise gerada pelo modelo capitalista promovido por suas economias, que perseguem o lucro máximo, enquanto destroem a natureza, os territórios e a vida de populações inteiras.

A partir dos acúmulos obtidos nas atividades autogestionadas Economia Feminista como alternativa ao capital e Mulheres contra as guerras e o genocídio no Brasil e na Palestina, apresentamos o presente documento com análises e recomendações para contribuir no avanço de alternativas concretas para a crise do capital:

As mulheres palestinas e brasileiras denunciam a violência sexista do aparato militar!

Nós mulheres sabemos que, quando há momentos de crise econômica e política, o conflito e a guerra surgem como nefastas soluções para retomar o lucro do capital. Nossos corpos são utilizados para amortizar os impactos das crises, seja no aprofundamento da responsabilização pelo trabalho doméstico e de cuidados, seja como corpo passível de violência. A indústria militar e de armamentos é um dos principais instrumentos utilizados por países imperialistas para aquecer suas economias e aprofundar processos de controle de corpos, vidas e territórios, gerando lucro através da destruição e da morte. Seja contra outra população ou sua própria, os Estados fortalecem suas forças militares, públicas e privadas, como forma de exercer poder e supremacia.

Assistimos em tempo real o genocídio do povo da Palestina promovido pelo estado de Israel, que, com apoio e conivência dos Estados Unidos e países do Norte Global, se utiliza do discurso de autoproteção para exterminar a população palestina e ampliar o seu poder territorial por toda a Faixa de Gaza e agora para o sul do Líbano. Esta é uma posição estratégica para o imperialismo naquela região. No Brasil, a mesma lógica militarista de controle do território é empregada pela polícia, por grupos narcotraficantes e milicianos nas favelas e territórios populares; o resultado é o genocídio da população negra, gerando lucro e audiência para os telejornais. Além disso, também com um discurso de autoproteção e desenvolvimento econômico, o avanço do agronegócio, da mineração e do garimpo sobre territórios indígenas aprofunda o genocídio dos povos, enquanto alimenta uma cadeia de exploração e destruição ambiental.

As mulheres são as maiores afetadas pela militarização como solução para a questão da segurança, seja para garantir a soberania do Estado, seja para combater o crime organizado. A lógica militarista, organizada a partir da hierarquia, disciplina e submissão, reforça visões dicotômicas e considera as mulheres inferiores aos homens, o que serve de justificativa para a perpetuação de diversas formas de violência sexista.  Nossos corpos servem de amortecedor social para o aprofundamento das desigualdades em momentos de crise do capital.

As mulheres Palestinas denunciam:

  • O uso da violência sexual e do estupro como armas de guerra utilizadas pelo Exército de Israel para controlar seu território e promover limpeza étnica através do genocídio da população;
  • Denunciam também situações de estupro nas prisões israelenses, nas quais o abuso sexual e a violência extrema são utilizados como demonstração de força e virilidade pelos soldados e exemplo para outras prisioneiras;
  • Os relatos recebidos dão conta de episódios de extrema crueldade e tortura, nos quais soldados israelenses se divertem enquanto ordenam que mulheres palestinas peguem uma criança em seus braços e tentem fugir, enquanto atiram com fuzis pelas costas;
  • Enquanto não há possibilidades de acordos de paz por parte de Israel, a fome e as doenças avançam rapidamente devido as precárias condições de vida imposta pelo conflito. Mulheres e crianças sobreviventes sofrem sem acesso à água potável e sem acesso à comida, já que Israel alega medidas de segurança interna para impedir a chegada de ajuda humanitária vinda de outros países;
  • As mulheres gestantes não têm acesso à saúde, uma vez que todo o aparelho de saúde da Palestina está total ou parcialmente destruído; as mulheres que precisam realizar o parto com cesariana o fazem sem anestesia e em ambiente hospitalar inadequado para o procedimento;
  • As mulheres palestinas denunciam que perderam seus filhos e familiares em ataques com bombas, mas também perdem seus filhos para a fome e a doença, perderam seus filhos ao sofrerem aborto espontâneo devido a situação de extrema crueldade imposta sobre suas vidas;
  • As mulheres denunciam a violação de seus corpos, vidas e territórios pelo estado imperialista de Israel e a exportação deste modelo de (in)segurança para o resto do mundo.

Desde as favelas e territórios populares do Brasil, as mulheres também denunciam que esse modelo de segurança praticado por Israel para ampliar o poder imperialista no Oriente Médio é o mesmo empregado pelas polícias e por grupos narcotraficantes e milicianos em seus cotidianos. Israel é um dos principais países com quem o Brasil mantém relações econômicas na área da Segurança. Seja pelo comércio de armas, seja com a venda de tecnologias de vigilância e controle populacional, a política de segurança dos governos de Estado no nosso país reproduz práticas de terrorismo de Estado, promovendo o assassinato de crianças e jovens negros das periferias brasileiras.

Tendo em vista que o próprio governo brasileiro reconhece que o que acontece hoje com a população palestina na Faixa de Gaza e na Cisjordânia ocupada é um genocídio e que o Estado de Israel, frente às críticas feitas pela diplomacia brasileira nos espaços de acordos internacionais, reagiu com desrespeito ao tentar constranger o embaixador do Brasil em Israel, defendemos o fim das relações diplomáticas, econômicas e políticas e de cooperação tecnológica com o Estado de Israel e exigimos o fim dos ataques e do conflito no território Palestino e no Líbano.

Mulheres em movimento por uma Economia Feminista para enfrentar as crises e mudar o mundo!

Para enfrentar a fome, as guerras e a destruição da natureza, a Marcha Mundial das Mulheres defende a implementação de uma agenda política a partir da economia feminista. Colocar a vida à frente do lucro é a única saída possível para superar as crises econômica, social, política e ambiental do capitalismo. As mulheres em seus territórios são as maiores impactadas por esse processo e resistem cotidianamente ao avanço das transnacionais, da privatização dos bens comuns e do autoritarismo da extrema direita sobre suas vidas. Por isso, é a partir de suas lutas que emergem as alternativas ao modelo predatório que aprofunda as desigualdades.

As mulheres defendem um modelo econômico que priorize a vida e não o lucro!

  • Defendemos uma economia feminista que esteja baseada em relações de cuidado com a natureza e as pessoas, que esteja conectada com a produção agroecológica, economia solidária, hortas comunitárias, lavanderias coletivas e as cozinhas solidárias;
  • Defendemos o fortalecimento de cooperativas populares e formas de associativismo produtivo, que promovam a autonomia econômica das mulheres a partir da economia solidária, com práticas mais horizontais e participativas;
  • Defendemos a reorganização do trabalho doméstico e de cuidados, a partir da coletivização da responsabilidade com esse trabalho, principalmente revendo o papel dos homens;
  • Defendemos uma economia que combata a hiperconcentração de renda na mão de poucos e que estimule as alternativas econômicas desenvolvidas nos territórios populares ao redor do mundo;
  • Defendemos uma vida livre de todas as formas de violência contra as mulheres!

Resistimos para viver, marchamos para transformar!

Rio de Janeiro, 15 de novembro de 2024.

Sobre @admin